- Bom dia! Fazendo exercício logo cedo?
- Que nada. Recolhendo o lixo que o pessoal do prédio joga no meu telhado.
Ele tira do bolso um saquinho de supermercado e coloca em volta da mão, para recolher, argh!, um absorvente, do tipo O.B., devidamente utilizado. Que vergonha. Como não tem prédio do outro lado da casa dele, só pode ser o pessoal daqui. Meus vizinhos. Alguém que cruza comigo no elevador. Será a dona Arminda do 62? Ela tem bem o jeitão de que no fundo vive assistindo aqueles vídeos de sadomasoquismo no Youtube. Sei lá, aqui no prédio tem de tudo. Até um apartamento cheio de estudantes universitárias que estão sempre dando festinhas. Enfim, não dá pra julgar, mas coitado do Valdir. Fico tão constrangido que me despeço e volto pra dentro de casa.
Esse negócio de jogar lixo pra tudo quanto é canto é um tanto polêmico, porque as pessoas o fazem com a maior naturalidade. Conheci um microempresário que, ao realizar entrevistas de contratação de pessoal para a sua empresa, perguntava se o sujeito era de jogar papel de bala na rua. É claro que todo mundo respondia que não, e aí ele julgava se o estavam enganando ou não. Nunca conseguiu segurar funcionário mais de um mês na empresa, porque quando acreditava nos bons costumes de um ou outro, algum tempo depois era surpreendido por uma mesa de trabalho toda emporcalhada, e acabava desmascarando e demitindo a figura. Não precisa ser exagerado assim, mas que a coisa incomoda, ah!, isso sim.
Uma vez, dentro de um ônibus, duas meninas voltavam da escola e uma delas desembrulhou a bala, pôs na boca, e jogou o papel pela janela. O vento desenhou para o pequeno detrito uma trajetória extraordinária, fazendo-o entrar no coletivo pela janela de trás e cair no colo de um velhinho, que ficou possesso. Um professor meu na faculdade dizia que o cúmulo do deleite da burguesia é buzinar dentro de túnel. E sabe que eu acho essa imagem perfeita! O desrespeito pela coisa pública é geral no Brasil, desde as escolas até os postes de luz, vejam vocês. É capaz de um cidadão (se é que podemos considerá-lo assim) que bate com o carro num poste e causa queda de energia elétrica em uma rua inteira, saia feliz da vida por não ter se machucado e por seu carro estar devidamente segurado. O poste e os moradores da rua que se lasquem! Lembro de certa noite, quando era adolescente, em que esperava ansiosamente o fim da novela das oito pois na Tela Quente seria exibido Indiana Jones e o Templo da Perdição (falando nisso, não vejo a hora de assistir ao novo Indy!) Não é que o moleque do décimo primeiro jogou um saco de água justo sobre um fio desencapado, causando a queda da energia no prédio e melando minha diversão da segunda-feira à noite!
Enfim, divaguei sobre lixo, descambei para apagão, dá até pra parodiar Macunaíma. Muito lixo e pouca energia, os males do Brasil são!!!! E por falar em segunda feira, mais uma semana se inicia, é dia de branco outra vez. Na mesma varanda de ontem tomo meu café, porém devidamente paramentado, de paletó e gravata, não mais de chinelo e em mangas de camisa. Vejo o Valdir saindo de casa para mais um dia de labuta. Lembro mais uma vez do incidente desconcertante de ontem. Ih! O cara acabou de colocar uma bala na boca. E jogou o papel na calçada...
Um comentário:
Adorei a do Grimello...rs
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